Propaganda irregular: Candidatura do prefeito de Independência sofre segunda cassação

Hoje por volta das 11:38 foi publicado na pagina do TER/CE mais um decisão de cassação de registro de candidatura ao cargo de prefeito do atual gestor Luiz Valterlin Coutinho e da vice Raimunda Hilma Araújo Lira.


O juiz O Juiz Eleitoral da 39ª Zona Eleitoral de Independência, Paulo Santiago de Andrade Silva e Castro em ação ajuizada pela coligação “Juntos Pela Renovação de Independência”


O juiz julgou procedente a Ação de Investigação Judicial, entendendo que o candidato praticou ato vedado pela legislação eleitoral, ou seja, propaganda irregular no período.

VEJA A SENTENÇA NA ÍNTEGRA:

PROCESSO:
Nº 0000081-93.2016.6.06.0039 – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL UF: CE
39ª ZONA ELEITORAL
MUNICÍPIO:
INDEPENDÊNCIA – CE N.° Origem: SN
PROTOCOLO:
768972016 – 21/08/2016 18:42
REPRESENTANTE:
COLIGAÇÃO “JUNTOS PELA RENOVAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA” (PMDB-PRP-SD-PV-PSC-PSDB-PR)
ADVOGADO:
JOATAN BONFIM LACERDA
REPRESENTADO:
LUIS VALTERLIN COUTINHO
JUIZ(A):
PAULO SANTIAGO DE ANDRADE SILVA E CASTRO
ASSUNTO:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – DIREITO ELEITORAL – Abuso – De Poder Político/Autoridade – PEDIDO DE CASSAÇÃO DE REGISTRO
LOCALIZAÇÃO:
039 ZE-039 ZONA ELEITORAL – INDEPENDÊNCIA
FASE ATUAL:
26/09/2016 11:38-Registrado Sentença de 26/09/2016. Com decisão

SENTENÇA N. 83/2016

RELATÓRIO

Trata-se de AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ajuizada pela Coligação “Juntos pela Renovação de Independência” em face de Luis Valterlin Coutinho e Raimunda Hilma Araújo Lira Coutinho, sob a alegação de que o primeiro – prefeito e candidato à reeleição – teria espalhado pela cidade de Independência placas de propaganda institucional exaltando sua administração e em período vedado, configurando abuso de poder político. Requer – ao final – cassação do registro da candidatura dos Investigados.

Acompanha a inicial documentos de fls. 11/34.

Despacho inicial determinando a notificação do investigado e sua vice de chapa – fls. 35.

Os investigados Luis Valterlin Coutinho e Raimunda Hilma Lira Coutinho apresentaram defesa que repousa às fls. 37/52. Juntaram documentos de fls. 55/57. Alegam, preliminarmente: ilegitimidade passiva porque foram adotadas providências para coibir prática de condutas vedadas; no mérito: aduzem que as placas foram retiradas tão logo houve conhecimento da permanência delas; discorrem acerca do encurtamento do prazo de propaganda eleitoral e necessidade de simetria com os prazos de condutas vedadas; afixação antes do período vedado, conteúdo informativo e não caracterização de publicidade institucional; ausência de abuso de poder com gravidade para macular o pleito; ausência de potencial lesivo na conduta dos representados. Pedem improcedência.

Determinada vistas ao MPE – fls. 57 verso. Sobreveio parecer – fls. 58 – pela desnecessidade de produção de prova oral e requerimento pelo julgamento antecipado da lide.

Designada audiência de instrução às fls. 59.

Audiência de instrução às fls. 63/64.

Alegações finais do investigante às fls. 65/74; dos investigados, fls. 76/78 e 95/98; MPE às fls. 87/94.

Despacho de fls. 104 verso determinado ao Investigante que integre à lide a candidata a vice.

Integrada à lide, notificada, ratificou os termos do processo – fls. 111.

Às fls. 112 houve conversão do julgamento em diligência consistente na aferição da fonte de custeio da publicidade mencionada, sobrevindo documentos de fls. 114/128.

Reaberto o prazo para alegações finais – fls. 128 verso.

O Investigante manifestou-se às fls. 135/145; MPE às fls. 151/152; Investigado não se manifestou.

Vieram os autos conclusos.

FUNDAMENTAÇÃO

Preliminar de ilegitimidade passiva arguida por Luis Valterlin e Raimunda Hilma.

O primeiro – prefeito municipal candidato à reeleição – afirma sua ilegitimidade porque editou decreto determinando aos seus secretários que se abstivessem de praticar condutas vedadas, sendo deles, então, a responsabilidade pela suposta prática. A segunda diz que não integra os quadros do poder executivo, sendo membro do Poder Legislativo local, não possuindo responsabilidade pelo ato.

Afasto a preliminar de ilegitimidade passiva porque o cerne do feito repousa em identificar o ato reputado abusivo e a quem ele teria aproveitado.

Na exposição fática inicial há expressa menção à finalidade política da conduta, que refletiria benefícios à candidatura à reeleição dos representados Luis Valterlin e sua vice de chapa. A descrição fática inicial, então, aponta a subjetividade passiva dos representados, compreensão que chego à luz da teoria da asserção. Rejeito a preliminar.

Preliminar de integração à lide – além dos candidatos supostamente beneficiados – dos agentes públicos envolvidos nos fatos ou nas omissões a serem apuradas.

Alegam os Investigados necessidade de extinção do feito sem conhecimento do mérito porque não integrados à lide os agentes públicos responsáveis pela instalação das placas reputadas ilegais. Na linha da teoria supramencionada, a exordial traz à investigação suposto abuso de poder político cometido – em tese – pelo prefeito municipal, candidato à reeleição, ora investigado. À lide fora integrada sua vice de chapa. Não há qualquer outro agente público apontado como responsável pelo ato senão o já mencionado. Dos fatos narrados, então, tenho por correta a pertinência subjetiva. Rejeito.

Mérito

Entendo que o feito está pronto para ser julgado no mérito, considerando as provas apresentadas e produzidas nos autos.

Os fatos: a coligação investigante afirma ter o prefeito municipal de Independência, abusando de seu poder político, instalado placas em pontos estratégicos do município veiculando propaganda institucional em período vedado e em nítido caráter de promoção pessoal porque associa à sua imagem – fotos pessoais dele – obras realizadas, notadamente aquelas ligadas ao abastecimento de água.

O fato em apuração, então, cinge-se em saber se houve a instalação de placas contendo publicidade institucional em período vedado pela legislação eleitoral; a participação do investigado e a gravidade do ato.

No que toca à existência das placas e o período de permanência delas, as fotos de fls. 27; 29 e 34 – não contestadas pelos investigados – são suficientes à comprovação do alegado pelos investigantes: no mínimo permaneceram até o dia 21/07/2016 – data das fotografias.

O segundo fato a ser aferido diz respeito ao grau de controle ou conhecimento do candidato em relação ao evento abusivo.

Nas lições de José Jairo Gomes (GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 9º edição. Pág. 517/518):

” (¿) Se o objeto da tutela legal da ação em foco é a normalidade e legitimidade das eleições, à primeira vista parece despiciendo que o representado detenha pleno controle ou conhecimento do acontecido, já que o desequilíbrio da disputa é aferível objetivamente. Aliás, ante o teor do art. 20 da lei 9514/97, esse conhecimento pode mesmo ser presumido, porquanto o candidato é o responsável direto pela administração de sua campanha. De se lembrar, ainda, o princípio da solidariedade inscrito no art. 241 do Código Eleitoral. Se correligionários ou apoiadores promovem em prol de candidato eventos abusivos, comprometedores da higidez das eleições, o certo é que o processo eleitoral restará irremediavelmente maculado (…)” .

Aduz o Investigado em defesa escrita que adotou todas as providências necessárias a coibir a prática de conduta vedada, fazendo-o formalmente pelo decreto 133/2016 de 01/07/2016. Afirma que tão logo soube da existência das placas, determinou a retirada delas.

Em que pese o esforço defensivo, tenho o período em que as placas foram instaladas – vedado ou não – desimportante em sede de apuração de abuso de poder, que pode ser praticado em período anterior àquele vedado a certas práticas. Precedentes.

Inegável, embora prescindível, o conhecimento do Investigado acerca das placas, notadamente aquela identificada às fls. 32, porque – como por ele confessado – trafega diariamente pela via em que instalada e seria impossível não ver uma placa de 1,5×3,0 (fls. 115) em nítido efeito outdoor porque tem dimensão superior a 4m2.

Pretende Luis Valterlin Coutinho tornar-se refratário à responsabilidade por tais atos com a simples menção de decreto de sua autoria – enquanto chefe do Poder Executivo local – determinando a todos os secretários de sua administração que se abstivessem da prática de conduta vedada. Desperta atenção a data do decreto 133/2016: 01/07/2016 – data imediatamente anterior ao início do período vedado.

Trata-se de artifício preordenado à sua própria blindagem e de exequibilidade questionável. Observo que tramitam nessa especializada outras ações/representações em desfavor do Investigado, sendo meio comum de defesa a todas elas o mencionado decreto. Diga-se: não cumprido.

No caso específico desses autos, nem sequer o investigado teve o cuidado de apontar quem seria o ordenador da publicidade, reforçando a ideia de que editou o decreto como panacéia pelas ilegalidades cometidas.

Fixada a inquestionável instalação de placas de propaganda institucional e o beneficiário dela, necessária se faz incursão se o foi mediante abuso de poder político.

Convém gizar, nesse momento, a fonte de proibição do gênero abuso de poder – na seara eleitoral – para, na sequência, enfrentar a espécie em exame.

Diz o art. 14, parágrafo 9º, da Constituição da República:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

A lei complementar 64/90, em seus art. 19 e art. 22, XVI, prevê:

Art. 19. As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso de poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais.

Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados do Distrito Federal e dos Municípios.

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Púbico Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios, circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso de poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

XVI – para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado das eleições, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

Na dicção do mandamento constitucional, como observado pela doutrina mais abalizada, arrosta-se a influência do poder político ou econômico – ao lado do abuso dos meios de comunicação social – como elemento de alteração na normalidade e legitimidade das eleições, razão pela qual os fatos, necessariamente, devem ser graves.

A instalação de placas de publicidade institucional, contendo a imagem do prefeito municipal – candidato à reeleição e aqui investigado -, relacionando-o pessoalmente às obras públicas, no meu sentir, apresenta gravidade suficiente a comprometer a higidez do processo eleitoral.

Observo que não se trata de qualquer obra, mas justamente aquelas relacionadas ao que mais castiga o povo nordestino: a seca.

Associar à imagem do prefeito poços perfurados, dessalinizadores e adutoras – personalizando a autoria de obras públicas sensíveis – adquire contornos eleitorais gravíssimos nesse sertão, que é o mais castigado no estado do Ceará.

Autorizado pelo art. 23 c/c art. 24 da LC 64/90, é notório o conhecimento que o nordeste atravessa o quinto ano consecutivo de severa seca.

Nesse cenário, emerge a esperança de um povo sofrido, com vocação rural, em ser agraciado com abastecimento dágua.

Não raras vezes são encontrados artigos jornalísticos mencionando que – não fossem as inúmeras obras em todo o Estado -, talvez a situação atual seria mais caótica, assemelhando-se àquela descrita por Rachel de Queiroz em “O Quinze” : pessoas morrendo de fome e sede, rebanho dizimado, agricultura extinta. O povo expulso das terras pelas adversidades climáticas, transportados em trens para campos de concentração que mais pareciam currais humanos.

Um século depois o clima torna a castigar o sertanejo. Dessa vez, ciência e tecnologia disponíveis impedem aqueles resultados catastróficos. A natureza é vencida pelo Homem, que – com aqueles recursos – contorna os resultados provocados pelo clima.

Surge, então, o gestor, em todas as esferas de governo, como o definidor das políticas públicas voltadas – nesse ponto – ao socorro desse povo. Surge, também, a odiosa indústria da seca.

Em breve pesquisa na internet, percebe-se que o termo não é novo, sendo cunhado ainda na década de 60 do século passado por Antônio Callado, que definia Industria da Seca como estratégia de alguns políticos que utilizavam a tragédia da seca na região nordeste do Brasil para ganho próprio (fonte: http://www.infoescola.com/geografia/industria-da-seca/).

Ao espalhar placas pela cidade, com sua foto ao lado do água jorrando, tenho por gravíssima exploração do sofrimento alheio em benefício de candidatura, passando-se pelo homem das águas; causando na população alteração de estado de espírito suficiente à comprometer a higidez do pleito.

Observo que as placas em nada atendem ao mandamento constitucional insculpido no art. 37, parágrafo 1º.

Por fim, observo que a estratégia de exploração utilizada pelo investigado se torna mais repugnante na medida em que empregada nas principais vias de acesso à sede do município de Independência, de modo a atingir imensa parcela, senão a totalidade, de sua população.

Justifico: observando o mapa da sede do município, percebe-se que seu desenvolvimento se deu a partir do cruzamento de duas rodovias, a saber: BR 226 e CE 176.

A CE tem o sentido norte-sul, sendo que ao norte localiza-se o distrito de Ematuba, acesso ao município de Boa Viagem; ao sul o distrito de IAPI, acesso ao município de Tauá. Quem trafega por essa via no sentido norte, necessariamente passa pelo mencionado bairro Cohab, local de uma das placas; sentido sul, outra placa estava instalada.

Na BR 226, sentido Cratéus (oeste) mais uma placa estava instalada.

Percebe-se que o município foi cercado pela publicidade da figura do prefeito, ora Investigado.

Desimportante o fato de a publicidade ter sido doada porque o foi para o Município. Ademais, nem poderia ser para pessoa física de candidato porque vedada doação de pessoa jurídica.

Obiter dictum, a informação de as placas terem sido doadas ao município, contendo a fotografia do próprio gestor ocupando grande parte de sua extensão, conjugada com documentos que comprovam ser o doador contratado para fornecimento de material impresso é fato a ser apurado pelo MPE.

Forte em tais razões, reiterando a compreensão pela gravidade do ato, que deita raízes em bem – água -, cuja falta abre feridas no espírito da população local, além de fomentar a indústria da seca, tenho que a cassação de registro de candidatura dos Investigados é medida que se impõe.

DISPOSITIVO

Diante do exposto, Julgo procedente a Ação de Investigação Judicial ajuizada pela Coligação ” Juntos pela Renovação de Independência” em desfavor de LUIS VALTERLIN COUTINHO e RAIMUNDA HILMA ARAÚJO LIRA COUTINHO, condenando-os à cassação do registro de suas candidaturas aos cargos de prefeito e vice, respectivamente, nos termos do art. 22, XIV,da LC 64/90.

Transitado em julgado, cumpram-se os expedientes necessários.

PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE.

Fonte: TRE/CE

Porronca



Categoria:INDEPENDÊNCIA

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